O balé é uma arte que, ao longo da história, trouxe consigo um ideal estético bem definido. Muitas pessoas ainda associam a imagem da bailarina à de um corpo magro, quase etéreo, em que a leveza parece desafiar a gravidade. Essa visão, contudo, exclui muitos corpos e realidades, criando a falsa ideia de que o balé não é para todos — uma percepção que precisa ser transformada.
Com frequência, mães se questionam: “Minha filha é gordinha, será que ela pode fazer balé?” Ou então alunas adultas se perguntam se podem iniciar a dança, mesmo que estejam acima do peso. É fundamental lembrar que o termo “gordinha” já carrega um viés inadequado, e falar de “sobrepeso” de forma respeitosa é o primeiro passo para essa conversa inclusiva. Então, vamos desmistificar alguns dos pontos mais comuns sobre o balé e o sobrepeso, equilibrando a saúde, o cuidado com o corpo e a beleza da dança.
Balé e a Exigência Física: Um Olhar Responsável
O balé, assim como outros esportes, exige muito do corpo. O bailarino enfrenta movimentos desafiadores, rotações que vão além do que o corpo naturalmente permite, saltos altos, quedas suaves e um grande trabalho de equilíbrio e força. Pessoas com sobrepeso podem, sim, dançar balé, mas é importante que o treino seja adaptado e realizado com o suporte de um profissional qualificado. Isso porque, devido ao impacto dos saltos e movimentos repetitivos, o sobrepeso pode aumentar o risco de lesões musculares e articulares.
Segundo um estudo publicado no Journal of Dance Medicine & Science, o balé demanda uma carga significativa dos músculos e articulações, especialmente para quem está começando e não possui uma estrutura muscular consolidada. (Quin, E., Redding, E. & Scheper, M., 2021). Por isso, um professor de balé atento irá construir uma rotina de fortalecimento muscular e alongamento que respeite o corpo do aluno, promovendo um desenvolvimento seguro.
O Balé como Aliado da Saúde e Bem-Estar
O balé não é apenas uma forma de expressão artística, mas também uma atividade física completa. Ele promove um alto gasto calórico, ajuda a tonificar os músculos, melhora a postura e trabalha o equilíbrio. Para pessoas com sobrepeso, o balé pode ser uma atividade transformadora, não apenas ajudando no controle do peso, mas contribuindo para uma saúde integral, como aponta a Organização Mundial da Saúde (OMS). Segundo a OMS, atividades que envolvem o corpo de maneira ampla, como a dança, reduzem o risco de doenças cardiovasculares e promovem benefícios psicológicos ao diminuir os níveis de estresse (OMS, 2019).
Um estudo conduzido pela Universidade de Massachusetts apontou que, entre os adolescentes que praticavam balé, mesmo aqueles com sobrepeso mostraram uma melhora considerável em seus exames físicos e em indicadores de saúde mental, como autoestima e confiança corporal (Brown, R., 2022). Logo, dançar balé vai além da questão estética, oferecendo um benefício completo à saúde de seus praticantes.
A Cultura Estética do Balé e as Mudanças na Visão Corporal
O balé clássico tem raízes históricas em uma época em que a magreza era associada à beleza e leveza. Esse padrão estético está profundamente arraigado na dança, especialmente em companhias profissionais. Durante muito tempo, a aparência de corpos delgados foi valorizada tanto pela estética quanto pela exigência física da dança. No entanto, estamos vendo mudanças lentas, mas positivas, rumo à inclusão.
Hoje, bailarinas de diversos corpos estão ganhando espaço em grandes companhias de dança ao redor do mundo. Essa mudança reflete uma maior compreensão sobre a diversidade e o poder da dança para todos. Na prática profissional, é verdade que o desgaste físico é imenso, e as demandas são muitas. Entretanto, há espaço para bailarinas que fogem do “ideal” magro, especialmente em níveis amadores ou em performances artísticas menos exigentes fisicamente. A dança não precisa se limitar a um padrão específico e pode abraçar corpos diversos, promovendo inclusão e valorização das singularidades.
Balé Para Todos: Uma Nova Perspectiva
Assim como em muitas áreas artísticas, o balé começa a valorizar o movimento de corpos que não seguem o ideal clássico. Iniciativas como o curso Você Bailarina Kids, por exemplo, promovem o aprendizado da dança para todas as crianças, independentemente de talento ou da vontade de seguir uma carreira profissional. A dança deve ser inclusiva, promovendo bem-estar e alegria para quem a pratica, sem imposições limitantes.
A dança não é, e não deve ser, apenas para aqueles que atendem a um ideal específico de corpo. Quando oferecemos uma prática cuidadosa, técnica e bem estruturada, estamos criando um espaço seguro e acolhedor para todos. Com o balé, cada pessoa — com ou sem sobrepeso — pode se expressar, se fortalecer e encontrar uma atividade física prazerosa que contribui para a saúde, a autoestima e a conexão com o próprio corpo.
Por isso, se você sente o chamado para dançar, ou vê sua filha sonhando com a dança, deixe-a experimentar essa arte. O balé pode, e deve, ser um espaço aberto, onde cada passo e cada movimento celebram a diversidade do corpo humano. Afinal, a dança é para todos, e a beleza do balé está, sobretudo, na paixão que cada bailarino coloca em cada movimento.